Abril Indígena: nada mudou? O que mudou?

Texto: Eliane Potiguara (Site Uol)

    Imagem: Eduardo Fujise e Gideoni Junior / Itaú Cultural

    Outro dia, em conversa com um senhor no táxi, comparávamos os tempos passados com os atuais. Falávamos em torno de 1950 para cá, que é quando nasci. Ficamos estagnados ao observar tantas diferenças! Grande parte do que vivemos até 1980 não tem nada a ver com os tempos atuais. Até a educação das crianças e adolescentes mudou. Nos anos de 1910, quando foi criado o SPI (Serviço Nacional de Proteção ao Indígena) houve um projeto fascista para integrar (projeto de emancipação) as etnias à comunhão nacional. Isso significava jogar as comunidades à pobreza, à mendicância, ao trabalho escravo, ao alcoolismo, à prostituição, à miséria humana. Passadas várias décadas foi criada a FUNAI (Fundação Nacional dos Povos Indígenas, originalmente Fundação Nacional do Índio) em plena ditadura militar, órgão governamental que se propunha a subsidiar os povos indígenas e indígenas isolados. Mas isso também não aconteceu.

    Tudo foi muito bem arquitetado somente na teoria, porque na realidade em todas as décadas povos indígenas foram vítimas da violação dos seus direitos indígenas. Nem com a Declaração Universal dos Direitos. Indígenas, promulgada pelas Nações Unidas, nem com a Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), nem coma Constituinte de 1988 no Brasil, povos indígenas tiveram seus direitos assegurados.

      Imagem: Acervo Pessoal da autora Eliane Potiguara

      Mário Juruna (PDT) foi deputado federal, Marçal Tupã-Y conversou com o Papa, indígenas foram apoiados por organizações de cooperação técnica internacional com objetivos de formar organizações e seu fortalecimento. Organizações não governamentais apoiadas por antropólogos e ambientalistas progressistas fincaram pé para uma mudança nos direitos fundamentais das etnias brasileiras. O governo Bolsonaro (PL), logo que eleito, avisou que na sua gestão nenhuma terra iria ser demarcada, estimulou e abriu as portas para as mineradoras, madeireiras, empresários, etc. Muito mais assassinatos surgiram nesse desgoverno além das vítimas da covid-19.

      “Mulheres indígenas, organizem-se”

        Imagem: Instagram/Eliane Potiguara

        A cada minuto, indígenas assumiam seu protagonismo por meio das cotas nas universidades de todo o Brasil e iam crescendo no cenário nacional. Tomavam formas como advogados, professores, médicos, enfermeiros, antropólogos, engenheiros, agricultores, artesãos, gestores e profissionais formadores de opinião. Um certo dia, em 1990/1992 eu disse em alguns jornais, livros, textos, vídeos: “Mulheres indígenas, organizem-se mesmo dentro de suas casas”

        2023! Chegamos nesse ano, muitas coisas mudaram. Hoje temos uma ministra dos Povos Indígenas, deputadas federais, estaduais e vereadores. Advogados que tomam a frente dos direitos dos povos indígenas. A FUNAI, antes um órgão quebrado e de fachada, é presidida por uma mulher indígena. Então muita coisa mudou!

        Os povos indígenas têm exaltado e perpetuado suas culturas contra o sistema social, político e econômico. A exaltação é uma forma de resgate e preservação de algo. É a valorização daquilo que não é valorizado pelo sistema. A exaltação é afirmação na poesia da vida e da valorização dela. Na temática indígena podemos citar os desastres ambientais enquanto ao lado disso centenas de famílias pobres, desassistidas na Amazônia, Nordeste, Centro-oeste, leste e Sul do brasil encontravam-se invisibilizadas aos olhos governamentais.

        Trata-se aqui de dimensionar a extensão desses problemas ao longo de muitas décadas pois sofremos com o desmatamento, as queimadas, garimpo ilegal, justamente quando se fala em defesa do meio ambiente, quando se refere a todas as convenções sobre meio ambiente da ONU, aos acordos climáticos dos países, e ultimamente com a Cúpula Mundial (COP26) que aconteceu em Glasgow. O assunto é sempre o mesmo: o Brasil não se comprometia com uma política da defesa desse nosso meio ambiente e todos os problemas que envolvem essa destruição ambiental.

        “Tempo”, subjetivamente citado para nós humanos, sensibilizados com a problemática mundial e solidários ao próximo, é muito importante porque “tempo” corresponde ao momento em que se vive a vida, em que se constrói algo para si e para seus próximos com amor e devoção. O capitalista se apropria desse termo de forma errônea, onde “tempo” é sinônimo de cifrões, de acúmulo de bens, capital e riquezas, com produtividade.

        “Tempo” para nós, povos indígenas ou povos étnicos corresponde ao tempo de gestação de uma criança no útero da mulher, de um momento de um idoso a balançar em sua cadeira de balanço, ao momento precioso e ansioso da cura de uma enfermidade, ao momento de germinação e desenvolvimento de um coqueiro; ao momento das marés, dos ciclos da Lua, da ida e volta do Sol e de um pingar de lágrima.

        E o homem e a mulher são nutridos entre eles pelo olhar, pela busca do amor, pelas mensagens físicas ou espirituais que iluminam os corações que se amam. E tudo muda! Eliane Potiguara, escritora indígena. É autor do livro “Metade cara, metade máscara” e tem textos reunidos em seu site oficial.

        ** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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        Rodrigo Martins

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