Na COP30, Davi Kopenawa afirma que só governos não têm poder de ‘curar’ danos ambientais

Texto: Afonso Bezerra – Brasil de Fato

O líder indígena Yanomami, Davi Kopenawa, participou de uma mesa de debates, nesta quarta-feira (12), no terceiro dia da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), em Belém (PA). O encontro aconteceu na Zona Azul, uma das áreas mais restritas da conferência e é onde acontecem as chamadas negociações de alto nível.

Na noite de terça-feira (11), um grupo de manifestantes tentou entrar nesta área em um protesto contra o caráter restrito do evento e também cobrando a tributação dos super-ricos. Houve conflito com a segurança no local e uma pessoa ficou ferida.

Kopenawa chegou cedo, quase 40 minutos antes da conferência, em que iria falar sobre as soluções para o clima formuladas por povos indígenas e comunidades tradicionais. Como a sala estava ocupada ainda por outra atividade, fechou a porta e sentou-se um banquinho lateral.

Enquanto aguardava a hora de se apresentar, Kopenawa falou com exclusividade ao Brasil de Fato e revelou sentir pouca confiança nos encaminhamentos dos debates na COP30.

“O governo brasileiro não é médico. Ele não é médico forte pra curar o nosso meio ambiente, pra curar o nosso rio que tá poluído, pra curar a nossa terra que tá cheia de buracos. Buracos de mineração, buracos de destruição do garimpo, buracos pra fazer estrada. Muita coisa ruim”, lamentou o líder indigena.

Sentado em um dos corredores do Hangar, no Parque da Cidade, onde está montada a Zona Azul, Kopenawa observava a movimentação intensa de participantes enquanto manuseava o celular.

Vários sotaques circulando em um corredor um pouco quente, em um dia inédito com ar-condicionado funcionando precariamente. O líder indígena disse que não costuma ficar conectado e refletiu sobre o impacto das mudanças climáticas nos territórios indígenas.

“Nós estamos preocupados, vendo o nosso lugar sendo destruído, vendo a destruição da natureza”, adiantou. “Isso deixa a gente triste, deixa revoltado, porque não queria que o homem da mercadoria deixasse acontecer isso.”

Ao falar da relação ancestral de seu povo com a floresta, o líder Yanomami recordou o elo espiritual que o conecta à terra.

“Eu sou amigo da terra. Eu sou ligado à grande força da natureza. Sou também amigo das caças, dos animais, dos pássaros e também dos rios que a gente usa. É o rio que tem muitos peixes e esses peixes servem pra nós. Toda a natureza que foi criada serve pra todo mundo. A gente come, a gente usa a água limpa. Esse é o meu papel”, ponderou.

Questionado sobre o tema da palestra que iria proferir na tarde desta quarta-feira, a respeito das soluções para o clima, Kopenawa reagiu com serenidade: “Eu não conheço tudo”, afastando qualquer eventual expectativa de respostas prontas ou mesmo mágicas.

Em seguida, contudo, reavaliou que esse suposto desconhecimento na verdade é uma vantagem. “Conheço os problemas da cidade, os problemas que já foram criados há muito tempo. Nós somos povos originários, que não usam máquina, não usam avião, não usam navio, não usam carro, não fazem estrada, não constroem grande Estado, grande cidade.”

Descrente em relação aos resultados das Conferências do Clima, Kopenawa afirmou que nunca viu avanços concretos saírem desses encontros.

“Não resolveram nada de bom para a terra, para o planeta. Sempre foi assim, continua muito ruim. Eu nunca vi homem da cidade consertar o que está estragado. Você pode consertar seu motor, seu barco, sua máquina, sua casa. Isso você conserta. Mas destruição da terra, destruição do rio, mudança climática… Isso não tem como consertar”, reflete.

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Rodrigo Martins

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