Conheça a 1ª professora indígena da Universidade Federal de Goiás

Texto: Giovanna Campos – Jornal Opção

Eunice Pirkodi Caetano Moraes Tapuia, de 40 anos, fez história ao se tornar a primeira professora indígena concursada da Universidade Federal de Goiás (UFG). Desde maio de 2024, ela leciona sobre epistemologia indígena no curso de Licenciatura em Educação Intercultural, um programa voltado exclusivamente para estudantes indígenas.

A conquista de Eunice é resultado de uma trajetória dedicada à educação, que começou na Escola Indígena dos Tapuia, localizada na Aldeia Carretão, na região do Vale do São Patrício, a 280 km de Goiânia. A escola, pioneira no reconhecimento oficial do estado de Goiás, foi onde a professora passou mais de 20 anos ensinando e atuando como liderança comunitária.

Atualmente, Eunice é professora adjunta da Universidade Federal de Goiás, com atuação no Núcleo Takinhahaky de Formação Superior Indígena, na área de Ciências da Cultura. Ativista indígena, pesquisadora, escritora, mãe-solo e integrante da comissão da Coletiva das Mulheres Indígenas, Negras e Quilombolas do estado de Goiás, da Gira Leodegária de Jesus e do Grupo de pesquisas interculturais da linguagem (OBIAH). Também atua como secretária da Associação dos Índios Tapuios do Carretão (AITCAR) e do Conselho de Saúde Indígena do Povo Tapuia do Carretão.

Educação Intercultural na UFG

O curso de Educação Intercultural da UFG surgiu em 2006 como resposta a uma demanda histórica dos povos indígenas da região, incluindo os Tapuia, Xakriabá e habitantes do Parque Indígena do Xingu. O objetivo é oferecer uma formação superior que respeite e valorize os saberes tradicionais, promovendo um ensino alinhado às realidades e necessidades das comunidades.

Com 491 estudantes indígenas matriculados na universidade – 309 deles no curso de Educação Intercultural –, a UFG se tornou um espaço de fortalecimento da identidade e das epistemologias indígenas. Eunice, que já ensinou disciplinas como língua portuguesa, inglês, espanhol, artes, história e filosofia na aldeia, destaca que seu maior desafio na universidade é lidar com a diversidade de visões de mundo entre os diferentes povos.

“Cada povo percebe, interage e valoriza a sua própria epistemologia de acordo com suas cosmologias e cosmovisões. Isso tem a ver com a forma como cada povo transmite e produz conhecimentos. O desafio é também a riqueza, com a diversidade de povos, culturas, línguas e tradições”, explica.

O professor Alexandre Herbetta elogiou a trajetória de luta de Eunice, afirmando que sua presença é uma honra e representa uma transformação fundamental, especialmente no Núcleo Takinahakỹ da UFG, que há 16 anos se dedica à formação de professores indígenas e busca um mundo mais inclusivo e justo.

O curso atende aos indígenas do Território Etnoeducacional da Região Araguaia-Tocantins, do Parque Indígena do Xingu e da Terra Indígena Xakriabá, falantes de línguas pertencentes aos troncos Tupi e Macro-Jê e às famílias Carib, Aruak, Bororo e Trumai.

Provenientes dos estados de Goiás, Mato Grosso, Tocantins, Maranhão e Minas Gerais, os alunos pertencem a 32 distintas etnias: Akwẽ-Xerente, Apànjêhkra/Canela, Apyãwa/Tapirapé, A’uwẽ Uptabi/Xavante, Bakairi, Bero biòwa mahãdu/Javaé, Boe/Bororo, Crẽh cateh cati ji/Krĩkati, Guajajara, Ikpeng, Iny/Karajá, Ixỹbiòwa/Xambioá, Kajkwakhrattxi/Tapayuna, Kalapalo, Kamayurá, Kawaiwete/Kayabi, Khĩsêtjê, Krahô, Krẽka/Xakriabá, Kuikuro, Matipu, Mehinako, Mẽmõrtũmre/Canela, Mẽtyktire/Kayapó, Panãra, Panhĩ/Apinajé, Pyhcop cati ji/Gavião, Tapuia, Trumai, Wauja, Yawalapiti, Yudja/Juruna.

Uma vida dedicada ao conhecimento

A relação de Eunice com a educação começou na infância, quando sua saúde frágil a aproximou dos adultos e anciãos da aldeia, permitindo que recebesse ensinamentos tradicionais desde cedo. Apaixonada pela escola, ela aproveitava todas as oportunidades de aprendizado e, quando a aldeia conseguiu sua própria escola, foi escolhida para ser professora.

Ao longo dos anos, a docente acumulou um extenso currículo acadêmico, tendo se formado em Licenciatura Intercultural para Formação e Habilitação em Linguagem pela UFG. Posteriormente, especializou-se em Gestão Pedagógica, tornou-se mestra em Performances Culturais e atualmente é doutoranda em Direitos Humanos, também pela UFG.

Além de sua atuação na universidade, Eunice desempenha um papel ativo na luta pelos direitos indígenas. Ela é primeira secretária da Associação dos Índios Tapuia do Carretão, integra a Coletiva de Mulheres Indígenas e Negras Quilombolas, foi delegada da Conferência Nacional de Educação Escolar Indígena (CONEEI) e participa da coordenação do Grupo de Trabalho Português Indígena da Década das Línguas Indígenas da Unesco.

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Rodrigo Martins

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